terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Galerias do Rock


Acordei cedíssimo, mas isso não é muito anormal vindo de mim. Estava entusiasmada, estava prestes a ir a um lugar... Bem, não fazia a mínima ideia de como era o lugar, mas pelo nome, sabia que era bom. Vesti-me, maquilhei-me, e olhei para o espelho. "Será que está demais? Talvez não devesse sair de casa assim". Examinei melhor. Eu adorava, para mim estava tudo óptimo. O problema eram os outros. Mas saí mesmo assim, já não havia tempo para escolher outra roupa. Entrei no autocarro, sentei-me, peguei no ipod, e desliguei do resto do mundo. A música tomou conta de mim, como sempre.
Ninguém parecia querer estar sentado ao meu lado. Voltei a olhar para a minha roupa. Seria por isso? De qualquer modo, já não podia fazer nada. E pensando bem, não queria, sentia-me bem.
Saí do autocarro, e ainda tive que andar a pé. Estava um pouco desorientada, as ruas estavam cheias de gente, e nunca tinha lá estado. Sempre que parava para perguntar o caminho, as pessoas olhavam-me de alto abaixo. Quando andava, toda a gente se afastava, e observava. Eu era o ser estranho, o monstro, alguém que metia medo. Porquê? Porque não estava vestida da mesma maneira que os outros? Eu não quero ser só mais uma. Sonhava com um lugar onde "ser eu mesma" não fosse motivo para ser odiada. Gostava de ser valorizada por isso, e não julgada. E gostava que mais pessoas pensassem o mesmo que eu.
"Será que existe um lugar assim?" Sim, e tinha acabado de chegar a ele: As galerias do rock. Eram dois edifícios de cinco andares destinados a amantes desse género de música . Mas para além disso, eram a porta para liberdade. Ninguém era igual a ninguém, em nenhuma maneira. Cabelos de todas as cores, casacos de todos os tamanhos, t-shirts, corpetes, tops, camisolas, calças, saias, calções, collants, maquilhagem preta, vermelha, verde, roxa... tudo. E na cara de todos havia alegria, confiança, autonomia, determinação. Bastante diferente de tudo lá fora. Era o paraíso. E os deuses éramos nós próprios, as pessoas ao nosso lado, e os cantores estampados nas camisolas. Ninguém controlava ninguém, mesmo porque muita gente, assim como eu, não estava lá para gastar dinheiro, mas para observar e admirar.
Tive que me ir embora cedo, mas no caminho de volta nem reparei nas pessoas que olhavam para mim, porque sabia que eu era parte do meu próprio paraíso e a minha confiança era, de facto, algo positivo em mim. Espero voltar a algum lugar como esse muitas vezes, e espero um dia ser um dos deuses que ficam estampados nas camisolas.